2 poemas de Heberto Padilla traduzidos por Dilan Camargo
Dilan Camargo Heberto Padilla
“A censura é tão antiga e onipresente como a própria escrita”
George Steiner
Heberto Padilla foi poeta e jornalista cubano, nascido em Puerta del Golpe, Pinar del Río em 20 de janeiro de 1932 e falecido no estado do Alabama, Estados Unidos em 2000..
Em 1968, o seu livro de poesias “Fuera de del Juego” venceu o Prêmio “Julián del Casal” da União Nacional dos Escritores e Artistas de Cuba. Os jurados sofreram pressões e intimidações das autoridades e da UNEAC para que o livro não fosse premiado. Os jurados mantiveram os seus votos e o livro foi premiado por unanimidade. Compunham o júri: J.M.Cohen, César Calvo, José Lezama Lima, José Z. Tallet e Manuel Días Mastínez.
Junto da publicação do livro o Comitê Diretor da UNEAC inseriu uma Declaração expressando o seu desacordo com a premiação por entender que o livro premiado oferecia pontos conflitivos com a ordem política e era ideologicamente contrário à Revolução. Mais tarde, Padilla foi preso e obrigado a fazer uma retratação pública reconhecendo o seu “individualismo”. Foi libertado após um movimento internacional de escritores e intelectuais. Morreu exílado nos EUA.
“Fuera del Juego” foi traduzido para dezenas de idiomas, e, ao que se sabe, nunca foi traduzido no Brasil. Apenas um poema “Em tempos difíceis” foi traduzido por Nelson Ascher para uma coletânea de 124 poemas, pela Imago, em 1988.
Durante a pandemia dediquei-me a traduzir integralmente o livro “Fuera del Juego” como também a reunir todas as informações possíveis sobre o que ficou conhecido mundialmente como “O Caso Padilla”. Sergius Gonzaga estimulou esta tradução e está procurando viabilizar a sua publicação por alguma editora brasileira.
FORA DO JOGO
Para Yannis Ritzos, em um cárcere da Grécia.
O poeta, despeçam-no!
Esse não tem nada o que fazer aqui.
Não entra no jogo.
Não se entusiasma.
Não deixa clara a sua mensagem.
Não reconhece sequer os milagres.
Passa o dia inteiro ironizando.
Encontra sempre algo ao que objetar.
A esse tipo, despeçam-no!
Deixem de lado esse desmancha-prazeres,
a esse mal humorado
do verão,
com óculos escuros
debaixo do sol nascente.
Sempre
o seduziram as aventuras
e as belas catástrofes
do tempo sem História.
É
inclusive
antiquado.
Gosta somente do velho Armstrong.
Cantarola, sem parar
uma canção de Pete Seeger.
Entre dentes
a Guantanamera.
Porém, não há
quem o faça abrir a boca,
porém não há
quem o faça sorrir
cada vez que começa o espetáculo
e brincam
os palhaços pela cena;
quando as cacatuas
confundem o amor com o terror
e está rangendo a madeira do palco
e troam os metais
e os tambores
e todo mundo salta,
inclina-se,
retrocede,
sorri,
abre a boca
“pois sim,
claro que sim,
naturalmente que sim …”
e todos dançam bem,
dançam bonito,
como lhes pedem que seja o baile.
A esse tipo, despeçam-no!
Esse não tem mais nada o que fazer aqui.
POÉTICA
Diz a verdade.
Diz, ao menos, a tua verdade.
E depois
deixa que qualquer coisa aconteça:
que rasguem a tua página querida,
que derrubem a pedradas a tua porta,
que a multidão
amontoe-se diante do teu corpo
como se fosses
um prodígio ou um morto.
Dilan Camargo nasceu em Itaqui (RS), passou a infância e juventude em Uruguaiana (RS), na fronteira com a Argentina. Quando jovem, com um grupo de amigos, criou e apresentou um programa de músicas e comentários na Rádio São Miguel, além de editar um jornal impresso, dirigidos ao público jovem, com artigos e notícias. A partir de então, decidiu se tornar escritor. Concluiu Graduação em Direito na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e Mestrado em Ciência Política na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Trabalhou como professor, inclusive no ensino superior, e na Assembleia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul como Assessor Superior. É fundador, primeiro presidente, ex-secretário-geral e sócio da Associação Gaúcha de Escritores. Foi Membro do Conselho Estadual de Cultura, eleito pela comunidade cultural em dois mandatos, tendo exercido os cargos de presidente, vice-presidente e secretário-geral. É membro da Associação Nacional de Escritores e Ilustradores de Literatura Infantil. Foi, por duas edições, jurado do Prêmio RGE/Governo do Estado de Cinema Gaúcho; e, em 2005, jurado do Prêmio Nacional de Contos Josué Guimarães. Como escritor, publicou diversos livros de poesia, poesia infantil e teatro, entre eles BrincRiar, Um caramelo amarelo camarada, e Com afeto e alfabeto. Os poemas aqui apresentados são de seu mais recente livro, A arte do medo, de 2019.
Somos independentes apoie nosso tabalho via pix (92) 994961969 com R$20,00, você tem o livre arbitrio para fazer seu pix com qualquer valor, nossos colaboradores agradecem. não vendemos assinaturas, portal está no ar com o esforço de seus idealizadores.